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FC Porto: O paciente do quarto número 4

Artigo de opinião de Gil Nunes.

FC Porto: O paciente do quarto número 4
Futebol 365

A relegação de David Carmo para a equipa B não constituiu uma surpresa de maior. Na realidade, com a equipa do FC Porto a ter nos centrais o seu “calcanhar de Aquiles, os últimos jogos constataram o foco noutras opções em detrimento do tal defesa que custou 20 milhões aos cofres do Dragão. O eixo fundamental do edifício.

Com um discurso muito frontal e verdadeiro, perceber Sérgio Conceição é basicamente interpretar o que ele diz sem grandes subterfúgios ou palimpsestos. Ouvir e ponto. No fundo, sem se fazerem “grandes filmes”. Para se ser jogador do FC Porto não basta assinar um contrato. É necessário sentir o clube. E nunca na vida, por causa de um jogador, se vai colocar em causa o grupo todo.

Assim se passou na sequência do afastamento de Casillas da titularidade que, no entanto, continuou a ser convocado. “Problema disciplinar não foi, senão comigo nem sequer era opção”, salientou na altura. E o que valeu nessa altura continua a valer agora. Sem desvirtuamentos.

E, a partir daqui, podemos passar para aquilo que Sérgio Conceição não diz mas que é presumível se seguirmos a sua estrada de raciocínio. Ou seja, não interessa se chegaste de borla ou se custaste 100 milhões. A partir deste momento és jogador do FC Porto e acabou. Ponto final. Treino, empenho e determinação. Porque se eu (Sérgio Conceição) fui “menino” para encostar o Casillas, também não me custa colocar de parte este ou aquele. Em prol do grupo. Em prol do clube. E a situação de David Carmo é particular e pode ser alicerçada em três eixos.

No primeiro ponto da análise. Desde que chegou, David Carmo viveu sempre com uma nuvem em cima da cabeça. Uma nuvem de 20 milhões de euros. Que pressupunha êxito imediato, até porque a qualidade é indiscutível e a margem de progressão substancial. Havia um problema tático para resolver. Ou readaptar. Se o Braga jogava com uma linha de três centrais de uma
forma quase permanente, já o desenho tático do FC Porto mergulhava numa linha de dois, com utilização muito regular de um central esquerdino – como é o caso de David Carmo. Que, ao longo do seu percurso, já muitas vezes jogou apenas com um parceiro na zona central. Pelo que a situação não era propriamente excêntrica. E o FC Porto, nesta temporada, até ensaiou a
tal linha de três supostamente mais propícia às características do seu paciente do quarto número quarto.

O segundo ponto de análise – e que demonstra que David Carmo só não triunfou porque não quis – residiu na criação de uma bolha de segurança chamada Ivan Marcano. Com rendimento assinalável sempre que foi chamado – para além de ter instinto de golo – a presença do central espanhol serviu para escudar o desenvolvimento mais tranquilo de Carmo em contexto de
laboratório. E, nestas coisas, o tempo cura tudo. E apaga os fantasmagóricos milhões. Na sombra, mas com empenho e acompanhamento, a plataforma estava lançada para que David Carmo recuperasse os índices emocionais e a tranquilidade necessária para impor a sua qualidade de uma forma natural e transparente.

O terceiro ponto – talvez mais crítico – assenta no desempenho de David Carmo nos últimos tempos. Insuficiente para um jogador do FC Porto: e não é só pelo facto do Barcelona marcar um golo fácil no Dragão na sequência de uma perda de bola no meio-campo e em que não houve recuperação por parte da linha defensiva; ou por uma entrada irrefletida que originou o golo de Holsgrove também no Dragão; ou, então, pelos últimos minutos na Amoreira, que ditaram o afastamento da Taça da Liga. É, sobretudo, por se constatar um jogador de serviços mínimos, sem grande alma ou rasgo, que se deixou mergulhar numa avaliação exibicional que, valha a verdade, é manifestamente inferior à dos seus colegas de setor.

Por isso, a sua despromoção acaba por ser natural e consequente dentro de um desempenho considerado, quase de forma global, não catastrófico mas sim bastante fraco para um jogador de equipa grande. Que teve todas as oportunidades para vingar. E não vingou.

Numa vírgula, de relance, convém referir que David Carmo dispunha de outro ponto a seu favor. A seleção. Esquerdino, com o chip dos três defesas instalado (tal como Roberto Martinez tanto gosta), a sua afirmação no FC Porto seria, por certo, recompensada com uma chamada regular à seleção. E, por conseguinte, uma valorização natural do seu estatuto e do seu passe. Não se pode tapar o sol com a peneira e dizer que as coisas correram bem. Não se pode. Agora, o que pode argumentar é que estavam reunidas todas as condições para que o jogador, atualmente, fosse um pilar e até com um valor superior àquele que foi investido na altura da sua contratação.

Se a despromoção à equipa B é um fenómeno reversível? Sim, pode ser. Mas a barreira é já ténue – aposta-se todo o dinheiro da conta bancária no “não”. E há a paisagem. O montante: é que toda esta narrativa faz com que os dragões tenham de recorrer ao mercado para se reforçarem, tendo em linha de conta as necessidades imediatas de uma equipa que está em
todas as frentes em Portugal e tem os oitavos da Liga dos Campeões no horizonte para disputar.

Para jogar no FC Porto, ou num clube grande, não basta ter contrato. É preciso ter atitude e, sobretudo, ter estaleca. Ser capaz, a todo o momento, de entender que todo o cenário que ultrapassa a vertente desportiva – os tais 20 milhões de euros – são residuais em prol de uma prioridade que se estabelece em todos os jogos. Se David Carmo não se consegue abstrair, então o melhor mesmo é procurar outros destinos. Sempre com essa mancha no curriculum: afinal de contas tive todas as oportunidades para ser feliz e não aproveitei. Porque fui refém de fantasmas que só existem na minha cabeça.

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